Damásio: seleção natural e consciência

António Damásio (Crédito: Philip Channing,University of Southern California) 
          Já faz tempo que a consciência deixou de ser o atributo que nos separa dos nossos companheiros do vasto reino animal.  A existência de comportamentos surpreendentes, que denotam algum tipo de "vontade" ou "consciência" em seres tão simples como as  bactérias ou sofisticados como os gorilas, nossos primos-irmãos, é inegável. Qualquer pessoa que observou um formigueiro, o peixe no aquário, ou o gatinho ronronante há de concordar. 
          Mas em que elas são semelhantes? E como qualificar as diferenças entre a "consciência" de uma bactéria e a de um chimpanzé ou a nossa?
          Quem encara o desafio de responder a essas questões é o neurocientista português António Damásio no livro  E o cérebro criou o homem (SP, Companhia das Letras, 2011). O título em português está longe de ser preciso e é uma brincadeira questionável para resolver a dificuldade de traduzir para o público em geral a complexidade do original em inglês Self comes to mind: constructing the conscious brain, de 2009.
          Corajoso, Damásio dá os primeiros passos para entender a origem da consciência já nas reações químicas dos primeiros seres vivos e como, pela ação da seleção natural, ela se constituiu nesse atributo que sabemos que portamos mas mal sabemos definir.
          Esse é o tema dos dois primeiros capítulos. Eles apresentam os princípios que norteiam a construção do que Damásio reluta em chamar de teoria, ou mesmo hipótese, e chama de "estrutura". Essa estrutura, que envolve homeostase, self, mente, cérebro, consciência e inconsciência, teria sido promovida pelo o que ele chamou de regulação da vida, o conjunto de processos que surgiram, permaneceram e evoluíram nos seres vivos porque, eles próprios, garantem a manutenção da vida no organismo.
         É realmente uma nova maneira de entender a origem da consciência, que coloca de cabeça para baixo a visão que temos de nós mesmos como portadores dessa conquista biológica. Vale a pena encarar o desafio de entendê-lo, pois mesmo que o autor se esmere em facilitar para o público geral, o assunto não é trivial.



Verônica Bercht
10/03/2012 
Revisado em:
14/03/2012

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